quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Fim de um romance (02/04/2007 – Terra Magazine)


Vários romancistas sofrem quando escrevem uma obra de ficção. Alguns fazem uma apologia do sofrimento, que Flaubert tanto evocava em sua correspondência para amantes, leitores, amigos e parentes. Na verdade, ele resmungava contra a dificuldade de escrever, às vezes traduzida por uma cólera autopunitiva ou por palavrões que prefiro não mencionar nesta crônica. Flaubert estava inaugurando o romance moderno, sabia que já não era mais possível nem desejável escrever como Balzac, Stendhal e Zola, três grandes escritores que o antecederam e, de certa maneira, justificaram a escrita bem elaborada e exata do autor de Três contos e A Educação Sentimental. 

Mas será que escrever ficção é uma atividade que passa apenas pelo sofrimento? Se fosse assim, a literatura seria um ato constante de masoquismo, uma flagelação do corpo e da mente. Prefiro dizer que Flaubert trabalhava como um louco: reescrevia mil vezes cada parágrafo, duvidava da eficácia de cada frase, procurava uma melodia e um ritmo para dar mais densidade à linguagem. 

Flaubert foi um dos escritores mais exigentes e críticos com o próprio trabalho. Para que o leitor tenha uma idéia dessa mania pela perfeição, os manuscritos dos rascunhos dos Três contos somam mais de mil folhas. Depurou tanto, que o livro tem 120 páginas. Para ele, a arte de escrever era inseparável do talento (ou da intuição) de selecionar, cortar, editar. Foi um mestre nisso. Ele renunciou aos prazeres da vida cultural, mundana e festiva de Paris e preferiu isolar-se na numa pacata e tediosa cidade da Normandia. Rompeu essa rotina com viagens ao Oriente Médio e à África - Egito, Líbano, Palestina, Turquia -, e desse mundo exótico pescou temas para escrever parte considerável de sua obra. 

II 

Agora, ao reler algumas cartas de Flaubert, penso que o prazer pela escrita, mais que o sofrimento, moveu sua vida. Nesse aspecto, ele foi um privilegiado: um herdeiro que dedicou doze ou quinze horas por dia para lutar com as palavras. É um trabalho exaustivo, não poucas vezes exasperador, mas afirmar que é puro sofrimento significa subtrair o desejo que move a escrita. E também a leitura de um texto de ficção. 

Sofrimento maior é terminar um romance e cair num vazio, pois os personagens (com seus conflitos, amores, frustrações e ambições) já não existem mais. Ou só existem para o leitor. Nada mais angustiante do que terminar um romance. O fim do mundo fictício gera uma solidão radical, sem os fantasmas que se materializam e falam na imaginação de quem escreve. Porque depois do ponto final, quando cessa o trabalho da imaginação, a realidade cobra seu dízimo. E a realidade é sempre mais complexa e terrível do que a ficção.

sexta-feira, 29 de julho de 2011

O escritor do livro Dois Irmãos, Milton Hatoum, fala sobre o ensino na Amazônia urbana




Como autor que retrata a Amazônia, o senhor concorda com a maneira como ela é apresentada nos livros didáticos?
o conheço essa região. A Amazônia com a qual eu lido é urbana: 80% da população vive em cidades.

Como encara o desmatamento que está acabando com a região?
Sinto muito quando o mogno é derrubado, mas me preocupo ainda mais quando um bairro próximo ao maior rio do mundo fica sem água.

E as escolas, comoo?
A maioria não tem biblioteca. Para se ter uma idéia da Educação aqui, soube que em Coari, a 360 quilômetros de Manaus, uma biblioteca foi derrubada para dar lugar a um estacionamento.

Qual é sua opinião sobre a adoção de seu livro Dois Irmãos por alguns professores?
É uma dádiva para o autor quando os professores gostam de sua obra, porque eles conseguem fazer com os alunos uma leitura orientada.

O que acha do ensino de Literatura nas escolas atualmente?
É importante trabalhar com livros que não afugentem os alunos. Se eu fosse professor, iniciaria com os contos de Machado de Assis.